Monday, November 14, 2005



‘Lucy In Sky With Diamonds’, Grafite sobre papel, Mauro Cerqueira, edição de Novembro 2005




As Máquinas de uma Sociedade Medíocre

Ao longo dos nossos dias, e sempre acompanhados pelos meios de informação, absorvemos imagens (estáticas ou em movimento) transmitidos pelos mais variados meios de comunicação. O fácil acesso, o imediatismo, a apatia cerebral e a rotina de certos hábitos diários, transformam-nos em máquinas de “sucção massiva”. A televisão e imprensa sensacionalistas viradas para o “show” crescem a uma velocidade alarmante, colocando em risco todo o tipo de filtros gerados por nós e pela nossa educação (a maioria das vezes de baixo nível). Na última década temos assistido, também, ao enorme aumento do consumo da Internet e dos telemóveis. A facilidade com que os manuseamos dão-nos maior conforto e autonomia mas caminhamos constantemente sob a corda bamba, em que a queda pode ser tanto ou maior quanto expansão destes meios.
Este mês no ‘Espaço Transportável’, Mauro Cerqueira (Guimarães 1982) apresenta-nos “Lucy In Sky With Diamonds” (com as iniciais LSD), remetendo o tema da banda britânica “The Beatles” para as drogas, reflectindo sobre o modo como somos “dopados” pelos media, funcionando como estimulante, aludindo à constante apatia da sociedade viciada, sendo necessária “uma nova revolução, uma que transforme radicalmente os modos de pensar e actuar”, afirma Mauro.
Este jovem artista frequenta actualmente o 3º ano de Pintura na Escola Superior Artística do porto, Pólo de Guimarães, sendo de realçar o seu papel dinamizador na organização de eventos artísticos, nomeadamente a ESAPARTE 08 e a exposição “Corpo a Corpo” que reuniu trabalhos de alunos e professores da sua escola superior. Este ano ingressou também no grupo de artistas que representaram Portugal no projecto GARBa no sul de Itália e participou na exposição “Aranha.Máquina.Giz”, que reuniu trabalhos de André Sousa, Mauro Cerqueira e João Giz.
“Lucy In Sky With Diamonds” de Mauro Cerqueira é uma mensagem simbólica, metafórica e principalmente carregada de ironia. As letras LSD aparecem emolduradas por algo próximo de um painel publicitário, deixando cair gotas sob a bandeira pirata, representativa da sociedade contemporânea, que vomita toda a informação consumida através da televisão e todos os vícios recorrentes – sexo, droga, álcool – construindo um circulo fechado sob si mesmo, rematado pela frase “Sociedade Medíocre”, o expoente máximo que este artista problematiza.


Luís Ribeiro



“A Arte é Comunicação”, Desenho Digital, Luís Ribeiro, edição de Outubro 2005

‘Quando o Contemplador se torna Artista’


Na primeira edição do ‘Espaço Transportável’, Max Fernandes apresentou-nos uma página em branco, atribuindo-lhe o título “S/Título”, ‘Semiologia sobre papel’, convidando o leitor a assistir ao fenómeno de construção de realidades, ironizando o carácter informativo e comunicativo tanto de um trabalho artístico como o de um jornal. De seguida, Isabel Carvalho mostra-nos um texto escrito por uma prostituta explorando a problemática feminista, atribuindo ao leitor do jornal, de certa forma, a oportunidade de enquadrar um texto (que numa situação normal poderia ser visto como uma mera notícia informativa) num patamar artístico.
Na terceira edição do projecto, o Notícias de Guimarães recebe o comissário do ‘Espaço Transportável’, Luís Ribeiro, Licenciado pela Escola Superior Artística do Porto, pólo de Guimarães. Membro criador do ‘Espaço Provisório’ em 2003, situado numa loja comercial na rua de Sto. António, em Guimarães, dedicado a intervenções artísticas, e também do Laboratório das Artes, projecto iniciado em 2004 numa casa desabitada da rua de Camões, na mesma cidade.
O trabalho deste artista para o Jornal pretende reflectir sobre o objecto artístico e a forma como ele é enquadrado e interpretado, as relações existentes entre artista/ objecto/ contemplador e a finalidade de qualquer obra – a Comunicação. O facto do suporte ser um Jornal, num primeiro ponto, irá alterar inevitavelmente a visão do observador, funcionando como premissa a qualquer raciocínio sobre o trabalho apresentado. Após este primeiro momento importa analisar a imagem, a mensagem e os objectivos para os quais a obra foi produzida; absorvemos a imagem enquanto obra plástica, contendo valores formais e estéticos do domínio da arte, afastando-se da ideia de notícia ou de um anúncio publicitário. O valor atribuído ao trabalho é feito individualmente, podendo ser compreendido ou não, válido ou rejeitado, sendo a interpretação fundamental para a sustentação do objecto artístico enquanto mensagem comunicativa. Assim, o Contemplador atribui valores independentes à obra, reflexões externas à imagem, conceptualismos que se sobrepõem ao próprio trabalho.

NG



"SUSY", tinta s/ papel, Isabel Carvalho, edição de Setembro 2005

‘SUSY’

Após um mês de paragem, o Jornal NG volta a receber mais um artista a convite de Luís Ribeiro, de forma a intervir artisticamente neste suporte. Isabel Carvalho, Porto 1977, tem-se destacado como Artista Plástica e autora de BD. Licenciou-se em pintura pela Faculdade de Belas Artes do Porto entre 1995 e 2000 e entre 2000 e 2001 fez o mestrado no Camberwell College of Arts (London Institute). Esta artista está ligada ao colectivo 'Alíngua'
que publica a revista Satélite Internacional, ao grupo artístico Ateliers Mentol, ao grupo feminista de intervenção artística ZOINA (uma palavra portuguesa pouco conhecida que quer dizer "mulher mal comportada"), entre outros. Seleccionando algumas das várias exposições de Isabel Carvalho, como a participação no projecto “Terminal”, no Hangar k7 na fundição de Oeiras; “Tale about Urban Piracy”, 2005, no Centro de Artes Visuais de Coimbra; “16 salas, 1 espaço” , 2005, no Laboratório das Artes em Guimarães; “National Museum”, 2004, na Galeria Marta Vidal, Porto; “WAW-women against women”, 2002, Galeria Marta Vidal, Porto; “Arte-Público”, 2002, Museu de Serralves, Porto e Culturgest, Lisboa, entre outras, podemos observar o dinâmico percurso que esta artista tem vindo a percorrer.
Relativamente ao trabalho específico para o ‘Espaço Transportável’, Isabel Carvalho apresenta-nos um texto assinado por “Susy”, uma prostituta de 29 anos que relata alguns dos problemas da sua profissão não liberal, como que uma tentativa de chegar aos mais diversos públicos. Questões como a mulher/objecto, o prazer/sofrimento, o dinheiro, a violência, as drogas, a exclusão social, a clausura, são aqui tratados na primeira pessoa, na tentativa de criar um diálogo com o leitor comum sobre um dos problemas que afectam a sociedade actual que todos parecemos esquecer ou pelo menos ignorar. A mulher vista como simples máquina sexual, de obtenção de prazer, independentemente da sua condição social e ideológica. Isabel Carvalho aproxima-se mais das questões do que das respostas, importando aqui o alerta, o chamar da atenção para problemas de ordem global, que parece continuar a infectar o sistema que as instituições tanto tentam preservar. A carta original pode ser visto na exposição inaugurada no passado sábado, na Galeria SMS (Sociedade Martins Sarmento), de Carla Cruz, intitulada “All My Independent Women”. Esta exposição funciona como uma individual, marcada pelo facto de Carla Cruz expor trabalho de outros artistas, como são os casos de Isabel Carvalho, Carla Filipe, Miguel Bonneville, Suzanne Van Rossemberg, entre outros. Uma espécie de momentos partilhados, marcados pela proximidade conceptual, temática ou ideológica, esta exposição é um activismo puro, de carácter sociológico extremamente reaccionário.

Luís Ribeiro




"S/ Título", 'Semiologia s/ papel', Max Fernandes, edição de Julho 2005

‘Espaço Transportável’ – Um artista por mês no jornal NG


O Jornal Notícias de Guimarães decidiu abarcar um projecto lançado pelo artista plástico Luís Ribeiro, no sentido de explorar este suporte para intervenções artísticas. O nome do projecto ‘Espaço Transportável’ remete-nos directamente para a ideia duchampiana do museu móvel, um local de intervenção e contemplação instável, capaz de percorrer diferentes locais, pessoas e conceitos. Assim sendo, a ideia passa por convidar um artista por mês para intervir no jornal.O diário francês Libération já abarcou projectos de designers como philippe Starck, autores de banda desenhada como Enki Bilal, ou artistas plásticos como Antoni Tàpies ou Daniel Buren, conseguindo uma tiragem de 200 mil exemplares, transformando cada obra única num múltiplo global.
Para iniciar o projecto, decidi convidar o jovem artista vimaranense Max Fernandes, ligado a projectos como o ‘Espaço provisório’, 2003, na rua de Sto. António, e ao Laboratório das Artes, em Guimarães. O trabalho deste artista prende-se, essencialmente, pelo uso da linguagem codificada, abarcando conceitos como os de “casa”, “espaço” e “campo”. No seu último trabalho “Intervenção sobre o mapa da cidade”, inserido na exposição ’16 salas, 1 espaço’, pode ver-se o uso de linguagem rigorosa, do GPS, através das coordenadas da Longitude e Latitude que marcam um local [neste caso foi o Laboratório das Artes].
Em “S/Título”, ‘Semiologia sobre papel’, continuamos a assistir a este fenómeno de construção de realidades. Semiologia, que deriva do grego semîon, refere-se à ciência dos signos, que neste caso não passam de uma folha em branco. No entanto, é-nos dada a legenda ‘museológica’ do trabalho, ironizando o caráter informativo e comunicativo tanto de um trabalho artístico como o de um jornal.

Luís Ribeiro